O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começou a cumprir a promessa de “abrasileirar” o preço dos combustíveis. Se o significado da expressão era uma incógnita na campanha eleitoral, continua sendo depois do anúncio de que a Petrobras abandonará a política de Preço de Paridade de Importação (PPI) para estabelecer quanto cobra por gasolina, diesel e gás de cozinha. “Nos alforriamos do PPI para executar uma política de preços a partir das nossas capacidades competitivas”, disse o presidente da estatal, Jean Paul Prates.
Apesar de as ações da Petrobras terem subido na semana do anúncio, ninguém entendeu direito a nova política. O certo é que ela procura não transferir a volatilidade das cotações internacionais do petróleo aos preços internos. Em termos vagos, a estatal informou que seus preços variarão de acordo com as condições locais de cada refinaria, para oferecer “a melhor alternativa acessível aos clientes”. De imediato, Prates anunciou a queda dos preços cobrados nas refinarias pela gasolina, pelo diesel e pelo botijão de gás. O governo celebrou, mas as ameaças para o futuro são evidentes e pode resultar no fim da empresa.
A medida foi adotada num momento de pouco risco, quando o barril de petróleo está cotado a menos de US$ 80, e o dólar caiu abaixo dos R$ 5. Ficou subentendido que a política será agressiva para manter os preços baixos, com interesse obviamente político (a popularidade de nenhum governo se beneficia com alta no gás e na gasolina). Num mercado competitivo, contudo, esse tipo de manipulação costuma criar problema. “Eles na verdade continuam a seguir o PPI na baixa, quero ver quando vier a alta”, diz um analista do setor.
A Petrobras praticamente domina o mercado brasileiro. Entre as refinarias menores, há apenas uma concorrente de peso, a Landulpho Alves, na Bahia. Mas, juntas, elas detêm 20% das vendas, e o Cade certamente será acionado caso a redução de preços configure prática anticompetitiva. Fora isso, o domínio de uma gigante como a Petrobras forçando preços baixos poderá tornar inviável o negócio das pequenas exploradoras (junior oils), que têm feito reviver a extração em áreas abandonadas e prometem investimentos bilionários.
Para o consumidor, o risco da queda artificial de preços é faltar produto. Se a Petrobras começar a vender barato demais na alta, as distribuidoras — que pagam a cotação internacional — pararão de importar. O caso mais sensível é o diesel. Pelos dados do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), 41% do mercado interno foi suprido por importações em dezembro, 22% em janeiro e 38% em fevereiro. Sem paridade com os preços internacionais, é certa a crise de desabastecimento.
O PPI foi instituído em 2016, quando a Petrobras se recuperava das dificuldades causadas pelo congelamento imposto pela presidente Dilma Rousseff. Atingida pela corrupção e por projetos inviáveis engendrados no Planalto, passou a subsidiar os combustíveis. Os equívocos resultaram na então maior dívida corporativa do mundo, US$ 100 bilhões. Foi a orientação para a realidade imposta com o PPI que recuperou a estatal. A atual gestão decidiu abandoná-lo por interesse político. No anúncio do fim do PPI não faltaram menções à “função social” da Petrobras. A expressão deveria preocupar seus milhares de acionistas, dentro e fora do país. O maior deles, não custa lembrar, é o governo. Na certa o contribuinte será convocado a cobrir qualquer rombo gerado pela nova política de preços.